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Rã em panela de água morna

Amena cavaqueira, com vista para as núvens negras que o sol de Inverno teima em tapar

 

Como se sabe do texto anterior, o meu amigo Zé veio a Lisboa. A oportunidade surgiu e combinámos encontrar-nos. Sim, porque pese embora alguns leitores do Blog já terem mostrado as suas dúvidas, o Zé é de "carne e osso", somos amigos há mais de cinquenta anos e não podíamos deixar passar esta ocasião para irmos almoçar com as nossas caras-metades e pormos a conversa em dia. Não porque não nos víssemos desde há muito, mas porque nas últimas vezes tínhamos estado rodeados de muitos e bons amigos e desta vez dava para uma conversa mais prolongada e até para entrar em mais pormenores sobre o seu amigo Chico da Terrugem. Quatro "horitas" foi quanto durou o almoço. Ou seja, foi um ápice, nem demos pelo tempo passar e, se não fossem as nossas companheiras começarem a "tocar as campaínhas", não sei quando é que a conversa pararia.

Falámos sobre tudo e mais alguma coisa. Os filhos, os netos, os amigos, as viagens no país e lá por fora, os livros, o futebol, as vidas profissionais que percorremos. Enfim, passámos a pente fino os ditos "bons velhos tempos", que nem sempre foram assim tão bons, e, aí, começámos a derivar para os tempos mais recentes e os "maus novos tempos" que pairam sobre a cabeça dos portugueses. E também sobre algumas das muitas ideias que moram na cabeça do Chico da Terrugem e que o Zé irá, a seu tempo e em função do que for acontecendo, actualizar com aquele caldo de cultura a que já nos habituou.

 

E que interesse tem isso para colocar em texto no Tu(r)bo d'Escape? Vamos a isso, vou dar as minhas razões procurando não ser redundante no que já consta em escrios anteriores; até porque temas novos, como fazer mais uma remodelação governamental exclusivamente ao nível dos "ajudantes dos ministros" (a terminologia tem o dono que se conhece), nomear para secretário de Estado um ex-administrador da SLN/BPN, ou pôr os deputados da maioria a fazer recomendações sobre a programação da RTP e o Relvas a coordenar a reestrututação da empresa que o própria queria "privatizar", não passam de pequenas manobras de diversão para "entreter o pagode" enquanto se prepara o assalto aos 4.000 milhões acordados com os "troikanos" e se faz crer que o Gaspar já pôs "os mercados" do nosso lado.

O que há de interessante na "amena cavaqueira", começa por ser o ter existido, o falar-se e procurar-se razões para o que se passa no país, abertamente, sem tabús mesmo nas questões em que o pensamento é consabidamente diferente, o que nos tempos que correm é tantas vezes evitado. É o ter existido indo lá atrás no tempo, procurando encontrar os porquês, lembrando as más experiências vividas na era "da outra senhora", recordando, até, os múltiplos casos  concretos de corrupção quando não havia políticos porque a política era proibida. É o ter existido para tomar bem consciência do muito que Portugal e os portugueses fizeram ao longo destes anos de uma ainda relativamente jovem democracia, mas também do que nunca se deveria ter feito e daquilo que foi preciso arriscar para conseguir uma evolução indesmentivelmente real e que, inevitavelmente, arrastou consigo algumas outras coisas que correram menos bem ou mesmo mal. É o ter existido para debater o presente, perscrutar o futuro, o nosso apesar do horizonte já não ser largo, e o dos nossos vindouros; com respeito pelo indispensável sentido biunívoco da solidariedade intergeracional.

 

O mais importante, que não o mais interessante, é a conclusão, a moral da história. A convicção, resultado da observação atenta do que se passa ao nosso redor, num âmbito restrito ou num domínio alargado, de que a sociedade, como um todo, não se indigna com as atrocidades a que está sujeita, assobia para o lado quando não lhe toca directamente, deixa-se embalar na cínica hipocrisia de pôr umas classes contra as outras ou uns grupos etários contra os outros, não quer aprofundar conhecimento sobre a teoria e a prática política que a está a atabafar, que a vai empobrecer até ao limite dos limites.

 

Amolecidos na nossa zona de conforto, ou inertes por um desconforto entorpecedor, estamos capturados como a rã que se deixa aquietar na água morna da panela que aquece em lume brando. Se não saltarmos desta armadilha, rapidamente e num esforço de cooperação mútua, não tardará muito que sejamos irremediavelmente aniquilados pela entrada em fervor da água que nos "garantem" estar agora a chegar à temperatura ideal.

Rui Beja

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publicado às 00:03

O Chico da Terrugem

Reflexões políticas com sabor a Alentejo - 2

Rui

Desloco-me a Badajoz praticamente todos os meses, primeiro porque gosto de ir a Badajoz e depois porque vou lá comprar revistas de História, que eles as têm variadas e, as mais das vezes, recheadas com temas de bastante interesse; obviamente que os artigos estão longe de atingir a profundidade cientifica das publicações académicas mas preenchem razoavelmente bem o seu objetivo de divulgação. A passada sexta-feira foi um desses dias.

No regresso, como sabia que o Chico estava em Elvas, ele telefonara-me há uns três dias para me informar que iam deixar Lisboa e que muito gostaria de bater um papo comigo, decidimos passar lá por casa.

 

Como creio que não estarás interessado em que te descreva a calorosa efusividade com que ele e a Rita de Cássia nos receberam, vou saltar imediatamente para a primeira observação do Chico:

- Vejo que continuas interessado nas coisas da História.

- Correto e afirmativo, como te teria respondido uma minha ex-colega de trabalho. Porem, antes que me esqueça, gostaria de te referir uma observação que o meu amigo Rui, como tive ocasião de te informar transcrevi a nossa última conversa e enviei-a ao Rui, uma observação, dizia-te, que o Rui fez quanto à tua prioridade em exterminar as baratas: não estarias, por acaso, a incitar à revolta, a sugerir uma revolução?

- Longe disso, nada disso, meu caro. Vade retro Satanas! como diria uma velha senhora piedosa que, de repente, se sentisse tentada pelo Maligno. Sou, sempre fui, um pacifista.

 

Deixemos as senhoras entretidas aqui no salão, acompanha-me, por favor, até à varanda, apetece-me saborear uma cigarrilha e a Rita de Cássia não permite que eu fume dentro de casa.

Para te esclarecer, o que eu propus foi, muito simplesmente, uma operação higiénica, nunca uma revolução. Já alguma vez te imaginaste a proceder à inventariação das siglas de todos os Organismos que, por uma ou por outra razão, são referidos na Comunicação Social, e que se alimentam unicamente da teta do erário público? Quanto custa anualmente cada um desses Organismos? Quais as mais-valias geradas? Posso estar enganado, mas era capaz de jurar que nunca ninguém se terá atrevido a efetuar essa inventariação. Não há muito tempo, deves estar lembrado, apareceu estampado nos jornais que o Estado não sabia, ao certo, quantos funcionários públicos existiam. Como julgo ter-te referido na altura, essa operação higiénica deveria ser extensiva aos Consultores Externos, que, na sua grande maioria, mais não fazem do que duplicar o exercício de competências já atribuídas a Organismos do Estado.

- O.K. meu amigo, está desfeita a confusão. E o que me dizes a todo este prestígio internacional que Portugal tem vindo a conquistar? Por todo o mundo somos referenciados como um país cumpridor. Vê a reação dos investidores internacionais, os juros dos sucessivos leilões de Dívida têm vindo a baixar e a procura tem excedido largamente a oferta. Não achas que estes sinais apontam, claramente, para a retoma no nosso país?   

- Tu o dizes. Mas, se não te importas, permito-me discordar. Se Portugal paga religiosamente qual achas que deveria ser reação dos credores? Aplaudir, evidentemente. É, contudo, necessário, separar muito bem as águas entre o serviço da dívida e a vida das pessoas. O Governo não foi empossado para recolher elogios dos banqueiros nem de lá fora nem de cá dentro, o Governo foi empossado, tão simplesmente, para gerir, de forma eficiente, as expectativas dos portugueses, melhorar a sua qualidade de vida. E o que está a acontecer é que Portugal está cada vez mais pobre, as pessoas têm cada vez menos rendimento disponível, o desemprego alastra, os jovens saltam daqui para fora, o tecido empresarial definha dia a dia. Creio que te lembrarás de uma velha cantiga do Chico Buarque que terminava assim, referindo-se ao Brasil: ‘ Este país ainda vai tornar-se um imenso Portugal.’  Parafraseando o Chico Buarque eu diria: ‘ Este país ainda vai tornar-se uma imensa Caritas Internacional.’

 

Uma coisa, porem, te garanto: quando estivermos já perigosamente perto da fase terminal os banqueiros que agora nos sugam e nos elogiam enquanto chafurdam e engordam na pocilga dos lucros imundos, esses mesmos banqueiros, travestidos de piedosos peregrinos, decidirão visitar este nosso pobre país, não numa daquelas chamadas missões de avaliação, mas numa missão piedosa, humanitária, universalmente publicitada, e que terá como objetivo principal a realização de uma cerimónia pública, em plena Praça do Comércio, durante a qual, numa fogueira de S. João, serão integralmente reduzidos a cinzas os ainda existentes Títulos da Dívida Externa Portuguesa. Para mestre-de-cerimónias irá ser designado o inefável Dr. Durão Barroso. E o seu discurso será mais ou menos assim:

‘Excelentíssimas autoridades, meus queridos amigos, meus caros compatriotas.

O meu coração rejubila ao verificar quão forte foi a vossa adesão a esta cerimónia que, apesar da simplicidade de que, por manifesta vontade de todos, se irá revestir, tem um grandioso significado para o presente e para o futuro deste nosso muito querido Portugal. Prometo não vos maçar com um daqueles discursos extensos e empolgados mas falhos de conteúdo. Prometo-vos ser breve.

Todos vocês, meus queridos compatriotas, já certamente se emocionaram ao ler nos jornais ou ver na televisão uma qualquer das muitas referências às grandes metas, em termos civilizacionais, que Portugal, o nosso querido país, superou nos tempos mais recentes. Todos estarão lembrados de que a nossa taxa de acidentes rodoviários era das mais elevadas, senão a mais elevada, da Europa. Hoje, como sabeis, anda muito próxima do zero. O facto de, nas nossas estradas e nas nossas cidades praticamente já não circularem veículos automóveis, não só reduziu drasticamente a taxa de sinistralidade como também diminuiu fortemente os índices de poluição. As cidades portuguesas têm atualmente, e isto podemos afirmá-lo com manifesto orgulho, uma qualidade do ar que faz sentida inveja aos nossos companheiros europeus.

Gostaria também de vos recordar, numa breve nota, a polémica gerada à volta de uma decisão governamental, tão oportuna como legítima, que, a despropósito, provocou uma onda de protestos onde, imaginem, até chegaram a estar envolvidos alguns membros da nobre classe médica. E o que pretendiam, meus queridos amigos, aqueles que, sem qualquer razão, protestavam? Pois pretendiam impedir ou, pelo menos adiar sine die, o encerramento de algumas maternidades. Totalmente dessincronizados  com a realidade essas ignóbeis mentes retrógradas ignoravam que hoje, tal como aconteceu na nossa sempre bem recordada Idade De Ouro que foi a gloriosa época dos Descobrimentos, quando demos novos mundos ao mundo, que hoje, dizia-vos, também os nossos jovens emigram quase todos levando incrustadas nas suas mentes brilhantes a excelência do nosso sistema de ensino, propagando assim o sagrado nome de Portugal nesta formidável diáspora contemporânea. A conclusão é óbvia, meus queridos amigos, se não temos jovens para que são precisas as maternidades?  

Portugal continua a ser, graças a Deus, um país democrático. Hoje seria impensável fazer reviver os decretos do passado, que instituíram e regulamentaram a temível censura prévia que cerceava a liberdade de informar. Hoje em dia a Comunicação Social, falada e escrita, é totalmente livre, pode expressar em total liberdade as opiniões dos seus redatores. Mas compete-me realçar a benéfica ação pedagógica exercida pelas respetivas Administrações que, tendo sempre presente que as suas receitas provêm maioritariamente da publicidade, e que, na prática, os únicos clientes a comprarem publicidade são os Organismos do Estado, uma vez que a quase totalidade do Setor Privado não tem fundos disponíveis, aconselham os seus jornalistas a ponderar com rigor, serenidade e elevado sentido patriótico uma eventual divulgação de quaisquer notícias, estudos ou comentários que possam, eventualmente, vir a entrar em contradição com o que é afirmado pelas autoridades competentes. 

Assim que os digníssimos representantes das Entidades Internacionais nossas credoras derem por concluída a redução a cinzas da nossa Dívida é imprescindível que vos comeceis a dirigir de imediato, e muito ordeiramente, para os autocarros que estão estacionados no Campo das Cebolas, e que vos conduzirão às várias delegações da Caritas Internacional, onde vos será servido o almoço. Sendo hoje um dia excecional foi-vos preparada uma surpresa que, assim julgamos, vos irá muito agradar. Lembrem-se que o sr. Ministro das Finanças já vos etiquetou como o melhor povo do mundo, por isso mantenham, por favor, um alto nível de civismo.’

- Puxa, Chico, estás derrotista como o caraças!

- Deixa-me terminar, por favor. Só para te acrescentar que um jornalista estrangeiro, invulgarmente surpreendido não só com a imensa mole humana que constituirá a assistência mas também com o seu constante sublinhar, com fortes explosões de aplausos, cada pausa estrategicamente ensaiada pelo orador, decidirá perguntar a um dos elementos de um grupo de manifestantes, daqueles que estarão mais à frente, o mais perto possível da tribuna, se eles se sentiam assim tão totalmente de acordo com tudo o que tinham ouvido. E a resposta será: ’ Qual quê, meu senhor! A gente importa-se lá com o que eles dizem... É sempre a mesma porcaria. O que se passa é que a gente já estamos habituados a amochar, a engolir tudo o que eles deitam cá para fora’. Nova pergunta do jornalista: ’Os senhores fazem alguma ideia de qual poderá ser a surpresa que foi mencionada pelo dr. Durão Barroso?’ E a resposta: ‘Sabemos sim senhor. É que uma prima deste meu patrício é cozinheira da Caritas Internacional e ela contou-nos. Essa é a razão principal porque é que a gente fomos dos primeiros a chegar, para ficarmos logo aqui à frente e assim termos a certeza de conseguirmos ir no primeiro autocarro e sermos dos primeiros a almoçar. A surpresa é que hoje a sobremesa é pudim de ovos e a gente temos medo que não chegue para todos’.

 

A Aninhas não conduz, pois não? Então está decidido, vocês vão ficar por aqui, jantam connosco e dormem cá em casa. Não tentes argumentar, por favor. Ia lá consentir que fizesses ainda hoje mais 40 e tal quilómetros… Jamais. Depois desta dose massiva de especulações apocalípticas, como certamente classificarás o último quarto de hora, acho que merecemos abrir um Tapada de Elvas, degustar umas tapas de presunto e apreciar o que ainda nos resta deste esplêndido cair de tarde de inverno, enquanto me contas umas estórias dos teus netos.

  

E mais o Chico não disse.

  

Com um forte abraço do

              

 Zé

 Vila Viçosa, 21 de janeiro de 2013.

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publicado às 22:26

Afronta Gratuita à Solidariedade Intergeracional

Carta aberta (pelo respeito que os governantes devem à dignidade de TODOS os portugueses )

 

Inconsciência: falta de responsabilidade

Social: que diz respeito à sociedade

Afronta: expressão ou acção injuriosa ou de desprezo

Gratuita: que não tem fundamento

Solidariedade: reprocidade de obrigações e interesses

Intergeracional: relativo às relações entre as gerações

 

A União Europeia declarou 2012 como «Ano Europeu do Envelhecimento Activo e da Solidariedade entre Gerações». Nesse âmbito, o Governo de Portugal emitiu, em Janeiro deste ano, um Programa de Acção subordinado ao seguinte lema:

 

Viver mais tempo implica envelhecer. Maior longevidade não é um fatalismo ou uma ameaça. É uma vitória da humanidade e uma oportunidade de potenciar o «património imaterial» que significa o contributo das pessoas mais velhas.

   

Pois bem, o ano que começou com esta enunciação de valores, tão nobre pelos princípios como abrangente por respeitar todos os portugueses, apresta-se para terminar com a mais sórdida prática fiscal, soez retórica política e despudorada propaganda demagógica: à amplamente reconhecida iniquidade das normas contidas no Orçamento de Estado para 2013, juntam-se agora as insidiosas declarações do primeiro-ministro, no dia 16 de Dezembro, ofendendo com a maior indignidade todos os portugueses e, em especial, os aposentados, pensionistas e reformados cujas pensões superem o "fabuloso" rendimento mensal de 1.350 euros!

 

Dispenso-me de tecer comentários e desfiar argumentos já profusamente enunciados pelos mais credenciados especialistas e respeitados juristas, que demonstram à evidência a ilegalidade confiscadora e inconstitucional da “Contribuição Extraordinária de Solidariedade”. Relembro apenas, que o OE 2013 prevê que a sua aplicação respeite, única e exclusivamente, aos rendimentos provenientes de pensões pagas pela Segurança Social e pela Caixa Geral de Aposentações e, pasme-se o despautério, também às pensões provenientes de fundos de pensões e de rendas vitalícias resultantes de património privado acumulado por via da poupança.

 

Centro-me exclusivamente na inconsciência social demonstrada pelo primeiro responsável (ao menos teoricamente) pelo governo do país, ao fazer, no discurso de encerramento do XXII congresso da Juventude Social-Democrata, as graves declarações que o jornal Público Online relata assim:

  

Passos diz que pensionistas ”estão a receber mais do que descontaram”

 

O primeiro-ministro defendeu este domingo que os reformados que recebem pensões mais elevadas devem ser chamados a contribuir mais que os restantes para o esforço colectivo porque estão a receber mais do que descontaram.

 

“Queixam-se de lhes estarmos a pedir um esforço muito grande e dizem que estão apenas a receber o que descontaram” ao longo da sua vida de trabalho”, afirmou o primeiro-ministro, para a seguir contrariar tal teoria. “Não é verdade. Descontaram para ter reformas, mas não aquelas reformas” que hoje recebem, vincou o chefe do Governo.

 

Estão, na verdade, realçou ainda, “a receber mais do que descontaram”. E as suas reformas são pagas por quem está hoje a trabalhar e que, quando chegar a sua vez de ser pensionista, terá reformas mais baixas do que os níveis de hoje. Os contribuintes de hoje terão reformas de acordo com a sua carreira contributiva."

 

Por isso, é “justo que aqueles que não descontaram na proporção que estão a receber e que têm pensões muito elevadas” sejam chamados a fazer um “contributo especial” numa altura de “dificuldades” como a actual….

 

Perante os “jotas” do PSD, o primeiro-ministro voltou a falar no assunto, argumentando com a necessidade de fazer uma redistribuição equitativa – dos recursos e dos sacrifícios.

 

“Por que é que 87% dos pensionistas não foram afectados” pelos cortes nas pensões, perguntou Pedro Passos Coelho. “Porque têm pensões inferiores a 600 euros, muitos deles fora do regime contributivo, quer dizer, nunca descontaram e têm que ser o Estado e os contribuintes de hoje a poder dar-lhes o mínimo para poderem viver com o mínimo de dignidade”, apontou o primeiro-ministro. Uma “responsabilidade intergeracional “ que é “indispensável na reforma do Estado. O que está em causa é gastar menos e gastar melhor”, acrescentou.

 

“Mas há 5% dos pensionistas, que são mais de metade do regime público, que recebem em média muito mais do que o dobro e na sua maioria não descontaram na proporção do que recebem hoje”, criticou o primeiro-ministro perguntando: “É isto justo? Querem encontrar na Constituição uma desculpa para perpetuar esta injustiça?”

 

Mais: “Onde estavam essas personalidades tão preocupadas com as suas pensões quando o sistema mostrou esta iniquidade e desigualdade que fere a sensibilidade social?” Passos Coelho defendeu depois a necessidade de um “Estado mais justo que redistribua melhor não a pobreza mas a riqueza que o país é capaz de criar”.

 

Leio, vejo na televisão e volto a ler e volto a ver… e custa-me acreditar. Custa-me acreditar que um primeiro-ministro de um país civilizado, que passa por uma grave crise financeira, económica, política e social, tenha o dislate e o despudor de afrontar gratuitamente a inteligência dos portugueses.

 

Custa-me acreditar que ao arrepio do mais elementar critério de bom senso e ao inalienável sentido de Estado que um primeiro-ministro não pode dispensar, Passos Coelho tenha resolvido deturpar realidades, escamotear factos, distorcer situações, omitir informação relevante, enfim, enviesar a verdade, para, incendiariamente, pôr portugueses contra portugueses. É indesculpável que, por mera inconsciência ou pensando que beneficiaria a política esquizofrénica deste (des)governo ultraneoliberal e da sua “amada troika”, tenha tentado pôr gerações mais novas contra gerações mais velhas, filhos contra pais, netos contra avós, menos favorecidos contra mais favorecidos… todos contra todos para mais facilmente destruir a classe média e cumprir o desígnio máximo de empobrecer Portuga!

 

Sabe senhor primeiro-ministro, eu, nós, os que vimos os nossos pais serem solidários com os nossos avós, os que beneficiámos da solidariedade possível dos nossos pais até termos recursos para ter casa própria, os que contribuímos para que os nossos pais tivessem pensões minimamente dignas, os que fomos obrigados a fazer uma guerra que não era a nossa, os que fizeram a primeira viagem de avião a caminho da guerra colonial, os que tivemos de trabalhar de dia e estudar à noite, os que pagámos integralmente as nossas contribuições para os sistemas públicos de reforma, os que tivemos a preocupação de proporcionarmos aos nossos filhos mais do que os nossos pais nos tinham podido dar, os que trabalhámos para o progresso de Portugal, os que apoiámos a implantação da democracia, os que poupámos o que podíamos para nos salvaguardarmos de imprevistos na velhice sem nos tornarmos um peso para os nossos descendentes, os que estamos dispostos a apoiar filhos ou netos que sejam apanhados nesta crise criada pelos interesses financeiros de magnatas sem escrúpulos, os que estamos a ser espoliados nas pensões que independentemente do que quer fazer crer não são superiores aos valores que descontámos… nós não lhe reconhecemos capacidade intelectual nem estatuto ético para nos dar lições de moral, e não lhe faremos a vontade de quebrar a solidariedade intergeracional.

 

Contrariamente ao que disse, a solidariedade não é “indispensável na reforma do Estado”, é sim” indispensável para a reforma do Estado”; do Estado Social que queremos, não do Estado Assistencial que nos quer impor, custe o que custar!

Rui Beja

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publicado às 10:03

Sr. Deputado!

02.12.12

Consegue dormir descansado, Sr. Deputado?!!!

Grito de alma de Rosário Gama*, no jornal Público de 2 de Dezembro de 21012

 

Consegue dormir descansado, Sr. Deputado da maioria, depois de ter levantado o braço para aprovar a lei do Orçamento de Estado para 2013? Não sentiu o braço pesado? E a sua consciência, não lhe pesou? É que a mim pesam e muito as medidas que os senhores acabaram de aprovar claramente discriminatórias dos "cidadãos" aposentados, pensionistas e reformados, grupo em que me incluo, em grosseira colisão do O.E. com o princípio da Igualdade, da confiança e da boa-fé.

No círculo familiar próximo do Sr. Deputado, não há “idosos” pertencentes à classe média, aquela que V. Ex.ªs querem exterminar? Ou são todos da classe alta?

Não vos disseram que a partir das medidas que os senhores aprovaram os vossos familiares também estão a ser roubados, relativamente ao compromisso assumido pela Segurança Social e pela Caixa Geral de Aposentações no momento em que se reformaram?

Não foram estes 270 mil, que os senhores consideram “privilegiados” que contribuíram para a economia, cultura e bem social deste país? E que dizer dos restantes, que perfazem os 2 milhões e 600 mil que, já agora vivem abaixo do “limiar da pobreza” tendo há muito ultrapassado este limiar para um nível negativo?

Não conhecem os senhores deputados da maioria que muitos destes cidadãos viveram toda a vida honestamente, descontaram o que o Estado exigiu para que tivessem direito a uma pensão de reforma calculada com base no valor desses descontos, e agora os senhores aprovam a redução dos escalões do IRS colocando pessoas com ordenados de 600 euros a fazer descontos de 14,5% para o IRS? E aumentam brutalmente os descontos para este imposto das pessoas que já não usufruem rendimentos do trabalho? Não conhecem o agravamento que a sobretaxa de 3,5% aplicada aos aposentados, pensionistas e reformados vem trazer às pensões de reforma deste grupo social?

Tiveram a coragem de aprovar uma contribuição extraordinária de “solidariedade” para vencimentos superiores a 1350 Euros, sabendo que isso é um imposto encapotado? Sabem que os aposentados, pensionistas e reformados assumiram compromissos que seriamente vinham cumprindo e que as medidas que os senhores aprovaram vão pôr em causa esse cumprimento? Querem ver os reformados a viver debaixo das pontes, depois de entregarem as casas por não cumprimento do seu contrato com os bancos? Querem ver os reformados a ter que ficar sem água, luz e gás devido às medidas agora aprovadas? Querem ver os reformados a “vasculhar” nos caixotes do lixo para recolher restos de comida? Os senhores sabem que muitos reformados ainda têm pais a seu cargo, filhos desempregados e netos para apoiar? Os senhores estão a ser coniventes com as medidas que o Sistema de Saúde está a preconizar para os “não utilitários”, prestando a estes só os serviços mínimos e acredito que sejam dos que pensam “que os nossos velhos já estão mortos e que, no fim de contas, estamos todos mal enterrados...”como diz Joaquim Letria, Eu se estivesse na situação dos Senhores Deputados, já não conseguia dormir com tanto peso na consciência e dor no braço que se levantou para apoiar estas medidas. É que eu já não consigo dormir a fazer contas ao que está para vir, mais ainda o que, fria e cruelmente, o Sr. Primeiro-Ministro anunciou na entrevista que deu à TVI relativamente às pensões de reforma, e dói-me não o braço, apesar de me apetecer dar muitos urros…na mesa, mas a Alma, esta coisa que parece faltar a quem nos (des)governa e aos senhores que votaram este orçamento que irá empobrecer o país.

Já agora, uma palavra para os senhores deputados do Partido Socialista: Se existe a convicção que uma determinada lei, e ainda mais a lei do Orçamento, viola a lei fundamental, é obrigação dos deputados pedir a verificação dessa constitucionalidade. Assim garantem que não vivemos numa república onde a lei constitucional é um mero adereço e a oposição uma mera sala de espera para o governo seguinte.

Maria do Rosário Gama

*Coordenadora da Pró-Associação APRe! - Aposentados, Pensionistas e Reformados

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publicado às 12:44

Empobrecimento

26.11.12

Passos de Hipocrisia

Palavras levadas pelo vento das acções que as contradizem, "custe o que custar"

 

O chefe do Governo de Portugal disse ontem, na Madeira: "...sabemos que quem mais acesso tem à televisão e quem mais vocalmente contesta o que estamos a fazer são aqueles que têm mais". Enfio a carapuça e afirmo: é um dever cívico de quem por via do seu trabalho e do seu grau de conhecimentos tem mais e está mais informado, não se calar perante quem tenta enganar os portugueses; todos os portugueses, os que têm mais e os que têm menos.

Por isso contesto e por isso contestam todos quantos não se acomodam à hipocrisia dos "passos" dados com truques e magias que têm um único objectivo, ideológico e económico-financeiro: emprobecer o país para melhor servir interesses inconfessáveis. Não os interesses dos portugueses que têm mais nem dos que têm menos, mas sim os daqueles, portugueses ou estrangeiros, que têm muitíssimo e dominam tudo o que os rodeia.

Para atingirem os seus fins não há hipocrisia que os envergonhe. Nem mesmo o pudor de assumirem o princípio que fez caminho em tempos que julgávamos ultrapassados: considerar perigosos os mais informados; agora na versão "quem mais acesso tem à televisão". Só faltam mais uns "passos" para que a meta do empobrecimento, da classe média e dos menos pobres de entre os pobres, seja "suavemente" atingida sob o manto do obscurantismo, via censura e repressão.

Por isso, há que lembrar e desmascarar, claramente, a HIPOCRISIA militante, a MENTIRA compulsiva e a CONTRADIÇÂO evidendente, que têm  como fim último o EMPOBRECIMENTO:

  • Sim, é verdade que  a chanceler Merkel que tanto apoiava o «PEC 4» do Governo anterior, e que tão incomodada ficou com o seu "chumbo", anda agora maravilhada com o «Plano de Austeridade» aplicado em overdose pelo actual Governo; indiferente à catástofre social que provoca e negligentemente alheia ao final infeliz a que a política do quanto pior melhor irá conduzir.
  • Sim, é verdade que a austeridade imposta pelo actual Governo em nada tem a ver com o programa eleitoral que apresentou aos portugueses, para uma vez eleito dizer que o memorando assinado com a Troika correspondia ao seu modelo de actuação e, logo de seguida, afirmar que iria mais longe ainda, custasse o que custasse; lavando as mãos das graves consequências daí decorrentes e regozidando-se por assim poder atingir o seu ultra-neoliberal desígnio de eliminar o «estado social» e regressar à política da «caridadezinha».
  • Sim, é verdade que o memorando assinado com a Troika pelo Governo anterior (e pelos partidos que constituem o Governo actual), tem sido pressurosamente executado, e até ultrapassado, de forma cega, surda e muda, contra todas as evidências de desatre anunciado; concretizando uma política de terra queimada facilitadora da pretendida desarticulação ad-hoc de direitos e garantias, constitucionalmente estabelecidos, em especial nos domínios do Serviço Nacional de Saúde, do Ensino Público e da Segurança Social.
  • Sim, é verdade que sob a batuta do "rigoroso e infalível" ministro da Finanças, foram cometidas ao longo de 2012 as maiores «trapalhadas», como também avanços, recuos e erros de previsão jamais vistos no nosso país, e que o OE para 2013 constitui um ataque despudorado à economia nacional e à vida dos portugueses; com a agravante de, consabidamente, não ter qualquer viabilidade de concretização.
  • Sim, é verdade que o burocrata conhecido como «etíopo da Troika», que chefia a missão em nome do FMI, teve a desfaçatez de se pronunciar sobre o ministro das Finanças de Portugal, avaliando-o sob a forma de elogio, como "muito impressionante"; isto não deixando de contestar a subida de impostos, dizendo "o que é útil é aumentar a base fiscal, alargá-la".
  • Sim, é verdade que a Directora-Geral do FMI tem afirmado repetidamente que os coefcientes técnicos e as políticas orçamentais utilizadas pela Troika estão desajustados e provocam recessão económica e socialmente indesejável, mas o certo é que o plano de ajustamento se mantém inalterável; com a rizível, se não fosse dramática, aprovação dos "funcionários" do FMI + União Europeia + Banco Central Europeu que constituem a Troika, e a inconsequente satisfação dos governantes portugueses.
  • Sim, é verdade que o presidente da multinacional alemã Bosch, que viajou com a chaceler alemã e foi recebido pelo Presidente da República, salientou que precisamos de manter  a actual estratégia de flexibilização de horários de trabalho e do pagamento de horas extraordinárias, lembrou que os custos do trabalho no nosso país continuam a ser 25% a 30% dos praticados na Alemanha, afirmou que com a continuidade destas medidas os países da Europa de Leste não são concorrência para Portugal, apontou a redução dos dias de férias como uma boa abordagem e disse que ainda não se esgotaram todas as possibilidades de ganhos de produtividade; indo ao concreto; explicitou que a carga fiscal não pode aumentar, mas cada um pode trabalhar mais!
  • Sim, é verdade que o economista belga Paul De Grauwe, professor da London School of Economics e investigador  no Center for European Policy Studies, disse hoje em Lisboa que "o Governo português pode estar a levar o rumo da austeridade demasiado longe e a puxar a economia portuguesa para uma espiral recessiva", acrescentando "não vai conseguir curar o défice orçamental e reestruturar a dívida pública assim", afirmando que o esgotamento desta via já mostrou várias vezes que pode levar os países em reestruturação para a insolvência, e fazendo referência à linha de acção do Governo ao dizer ao ministro das Finanças: "Vítor Gaspar, não exagere".

Rui Beja

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José Cardoso Pires escreveu, em adenda de Outubro de 1979 ao seu «Dinossauro Excelentíssimo»: "Mas há desmemória e mentira a larvar por entre nós e forças interessadas em desdizer a terrível experiência do passado, transformando-a numa calúnia ou em algo já obscuro e improvável. É por isso e só por isso que retomei o Dinossauro Excelentíssimo e o registo como uma descrição incómoda de qualquer coisa que oxalá se nos vá tornando cada vez mais fabular e delirante." Desafortunadamente, a premunição e os receios de José Cardoso Pires confirmam-se a cada dia que passa. Tendo como génese os valores do socialismo democrático e da social democracia europeia, este Blog tem como objectivo, sem pretensão de ser exaustivo, alertar, com o desejável rigor ético, para teorias e práticas que visem conduzir ao indesejável retrocesso civilizacional da sociedade portuguesa.

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